domingo, 30 de dezembro de 2012

"A RELÍQUIA" DE EÇA DE QUEIROZ E O NOSSO TEMPO


  1. “A única lei reconhecida pela fé é a do interesse naquilo em que ela vê como verdadeiro. Se o objetivo que ela persegue for absolutamente santo, ela não tem escrúpulo algum de invocar maus argumentos para sua tese, se os bons não forem convincentes. Se tal prova não é sólida, tantas outras o são!... Se tal prodígio não é real, tantos outros o foram” (Ernest Renan).




            Na virada deste Natal, 2.012, reli a obra de Eça de Queiroz, A Relíquia. Havia lido o livro há mais dez anos e na época gostei muito, pois ele sempre foi uma das minhas referências literárias na obra do imortal português. Mas, ao relê-lo, foi melhor ainda. Descobri novas passagens, novas citações, novas visões, novas descobertas, novas interpretações e, sobretudo, novas compreensões de sua identidade e relação com os tempos em que vivemos. Tempos em que procuramos suprir nossas incapacidades, fracassos e insucessos com essa religiosidade exacerbada que se manifesta de modo exponencial na vida das pessoas.

            A história se passa em meados do século 19 em Lisboa, Portugal. Tem como personagem principal, Teodorico Raposo, o Raposão, órfão de pai e mãe que é criado por uma tia e madrinha beata, d. Patrocínio das Neves. Esta, católica fervorosa, impõe uma formação católico-religiosa à criança que, por sua vez, apresenta um caráter totalmente avesso à aceitação da religião na sua vida. Não chega a ser ateu, mas debocha da crendice das pessoas e da própria tia, em verdade do Portugal piegas e carola do século 19. Raposão, além disso, alimenta uma ambição pela fortuna da tia que deseja herdar com sua morte, ao mesmo tempo em que esconde esses desejos, aliados à sua compulsão por mulheres e farras. Para herdar, no entanto, a fortuna da “titi” Patrocínio, Raposão tem de se portar como um autêntico carola, temente a Deus e infenso às “relaxações” (expressão usada por Eça, que naquele Portugal do século 19 tinha sinônimo de gandaia envolvendo mulher), tão odiadas e condenadas pela madrinha.

            Esse é o retrato preliminar que Eça faz da sociedade portuguesa daquele ano de 1.887 quando o romance foi publicado. Uma sociedade onde a religião, leia-se o catolicismo, tinha uma presença forte numa boa parte do povo português, no contraponto de posturas hipócritas que essas relações alimentam. Raposão, por assim dizer, encarna a hipocrisia e o oportunismo que os charlatães da fé se utilizam nos dias de hoje para enriquecer, e sua madrinha, a ingenuidade daqueles que têm na religião a sua tábua de salvação, desde uma unha encravada até a garantia de leito do reino de deus. Entre os dois, o charlatão e o crente - a onisciente e onipresente igreja. Qualquer semelhança com o Brasil e os tempos atuais não terá sido mera coincidência.

            Umberto Eco disse, ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, que o fenômeno da religiosidade se acentua e se manifesta com mais intensidade em tempos de desenvolvimento tecnológico. O Brasil está aí para provar essa assertiva, quando se tem – em tempos de internet - um enxame de igrejas, seitas, credos e crenças de todos os matizes se proliferando através, e sobretudo, da televisão, que vocaliza e leva “a palavra de deus” até aos seus fiéis mais indiferentes, num processo de massificação e sugestionamento. Nesse sentido, o Brasil de hoje é, em certa medida, o Portugal de A Relíquia: atrasado na educação, carente em saúde e segurança, precário em infraestrutura, mas rico em religiosidade!

            Assim, o romance se desenrola. Raposão é mandado para Jerusalém para conhecer de perto a terra onde o menino Jesus nasceu e na volta trazer algo para sua tia, uma “relíquia” da Terra Santa, demonstrando, naquilo que sua hipocrisia melhor lhe poderia render, ser um falso e empedernido crente perante sua tia, para render-lhe a tão cobiçada herança. A viagem para a Terra Santa é entremeada por farras e compromissos religiosos. Numa dessas farras, em Alexandria, a caminho de Jerusalém, depois de passar uma noite com uma prostituta, Raposão ganha dela uma camisola, como lembrança dessa falsa devoção amorosa que a messalina lhe atribui. Segue viagem com essa camisola, mas na volta, temendo chegar em Lisboa com algo que macule sua religiosidade e denuncie o cheiro da sua libertinagem, desfaz-se dela no caminho. Em seu lugar, adquire na Terra Santa a relíquia da “titi”, uma coroa de espinhos, os mesmos de uma árvore em que foram retirados para pôr na cabeça de Cristo a caminho do calvário, para provar toda a sua religiosidade, sua gratidão com a madrinha e assegurar a sua herança.

            Chegando em Lisboa, inexplicavelmente o embrulho com a relíquia veio trocado com a camisola da prostituta e, ao entregá-lo à madrinha, se vê denunciado de suas infâmias e falsidades, sendo escorraçado da sua casa e deserdado de sua almejada herança. Na rua da amargura, no entanto, descobre o quanto o povo é crédulo com as coisas de deus e passa a vender com sucesso as quinquilharias que trouxera da Terra Santa: água do rio Jordão, pregos da arca de Noé, azeitonas do monte das oliveiras, pedrinhas da Via Dolorosa, conchas do lago Genesaré, rosários, bentinhos, medalhas, lascas da madeira da cruz onde Cristo foi crucificado e toda sorte de bugiganga que esteja ao alcance da credulidade humana e do bolso dos espertalhões da fé. Essa atitude é estimulada pelo trecho em que o amigo de viagem à Terra Santa, o douto Topsius, lhe diz: “As relíquias, d. Raposo, não valem pela autenticidade que possuem, mas pela fé que inspiram”. Quanto essas palavras têm dado margem a um sem-fim de fraudes e vigarices em nome da fé religiosa!

            O livro, além dessa crítica à Igreja e ao comportamento sacro do povo português, traz no entanto, trechos de sublime beleza historio-filosófico-religiosa, não se prestando tão somente a uma censura barata à exploração da fé. Sabe-se que para escrever essa obra, Eça estudou a Jerusalém do tempo de Cristo na biblioteca de Londres quando era diplomata na Inglaterra nos idos da década de 80 dos anos 1.800. O romance entremeia com a crítica mordaz própria do seu autor, uma bela descrição histórica dos costumes, das leis, do comportamento do povo judeu; do clima, da geografia, de modo detalhado e descritivo da Judéia daqueles tempos. Narra sob o ponto de vista histórico e não religioso, o porquê Cristo, contra a vontade dos romanos, foi levado à cruz como um insurreto da lei e ordem judaicas, transferindo ao leitor fazer seu próprio juízo desse fato histórico desprovido de influências e interferências sectárias.

            Traz também a obra, ao contrário dos que torcem o nariz ao ver em suas linhas uma mera crítica à Igreja e seu rebanho, belas palavras que consagram a perpetuidade da fé cristã e, ao mesmo tempo, criticam aqueles que a exploram com desonestidade em seu nome vantagens econômico-financeiras. Em um trecho do livro isso é demonstrado por Eça,  quando, após a derrocada de Raposão, num diálogo com Jesus, este lhe diz que ele fingiu-se “devoto sendo incrédulo, caridoso sendo mesquinho” e simulou “a ternura de filho tendo só a rapacidade de herdeiro... Tu foste ilimitadamente o hipócrita!”, diz Jesus a Raposão. E, num discurso transcendental e sublime, que alcança não somente a fé em si mesma, Jesus diz a Raposão: “Eu não sou Jesus de Nazaré, nem outro Deus criado pelos homens... Sou anterior aos deuses transitórios; eles dentro em mim nascem, dentro em mim duram; dentro em mim se transformam, dentro em mim se dissolvem; e eternamente permaneço em torno deles e superior a eles, concebendo-os e desfazendo-os, no perpétuo esforço de realizar fora de mim o Deus Absoluto que em mim sinto. Chamo-me a Consciência; sou neste instante a tua própria consciência refletida fora de ti, no ar, e na luz, e tomando ante teus olhos a forma familiar, sob a qual, tu, mal-educado e pouco filosófico, estás habituado a compreender-me... Mas basta que te ergas e me fites, para que esta imagem resplandecente de todo se desvaneça”.

            Que palavras mais belas poderiam ser ditas num sentido que conjugue a fé e a racionalidade da ciência e a tão pregada e pouco usada expressão dos cristãos, de que não devemos usar – como se usa - o santo nome de deus em vão?

            Mas, como A Relíquia traduz dentre outras coisas a mordacidade e ironia de seu autor, a obra pontifica o cinismo dos exploradores da fé, dos raposões da vida, quando, após ver-se desmascarado pela camisola da prostituta que pensava tratar-se de uma coroa de espinho de Jesus, o seu personagem, Raposão, invectiva: “Sim! Quando em vez de uma coroa de martírio aparecera, sobre o altar da titi, uma camisa de pecado, eu deveria ter gritado, com segurança: ‘Eis aí a relíquia! Quis fazer a surpresa... não é a coroa de espinhos. É melhor! É a camisa de Santa Maria Madalena!... Deu-ma ela no deserto...’”.

            O livro ainda faz rir. E muito. Principalmente quando em certos trechos seus personagens se confundem com a nossa classe política dos dias de hoje. Por exemplo, ao se dirigir para Jerusalém levando toda a grandeza e ufanismo de Portugal e seu povo, Raposão, depois de deparar-se com realidade dessa falsa convicção, não perde a pose e diz a um inglês em tom de despeito e ridículo: “Eu sou Raposo, dos Raposos do Alentejo”. A frase molda-se perfeitamente ao slogan patrioteiro, “brasileiro nunca desiste” e que tem se convertido na pretensão de nossos presidentes ultimamente em dar lição de moral ao mundo, quando, em missões internacionais, Lula se propõe intermediar, por exemplo, a guerra entre judeus e árabes; e Dilma, dar aula e lição de economia aos europeus. Coisas de país subdesenvolvido e com a boçalidade dos raposões.

            Embora não seja crítico literário, nem de longe, não poderia deixar de registrar esses comentários sobre essa grande obra de Eça de Queiroz, numa época em que ela se identifica com nossos tempos. Uma obra-prima que, como seu autor, estava adiante de seu tempo.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

A DOENÇA DE CHAVEZ É UMA FARSA





“Devemos, em nossas relações, nos pautarmos pelo que é útil ou pelo que é honesto?” (Gabriel Tarde)


            Pode parecer uma temeridade a afirmação de que a doença de Hugo Chavez é um engodo, uma farsa. O que intriga mesmo para um observador mais atento não é propriamente a existência da doença em si, mas a forma como ela está sendo conduzida e pelas circunstâncias políticas que a cercam. Talvez seria melhor a afirmação, ou interrogação: a doença do presidente da Venezuela é mesmo grave como se tem anunciado?

            Desde que Chavez trouxe a público a sua doença em junho de 2011 (quando afirmou que havia sido operado dias antes em Cuba), o alegado câncer vem se manifestando mais politicamente do que sob o ponto de vista médico.  Em outubro deste ano consegue se reeleger presidente para um mandato até 2019, tendo como principal cabo eleitoral a exploração emotiva e sentimental de sua doença, quando sua reeleição era duvidosa. Agora, antes das eleições para os governos estaduais, ele anuncia o agravamento de sua doença a poucos dias da sua realização.

            No anúncio feito poucos dias antes das eleições dos governos dos estados na Venezuela, vimos um Chavez bem disposto dizendo à nação venezuelana que o câncer que havia antes declarado completamente vencido, voltara a se manifestar com gravidade. Disse que acaso morresse o povo venezuelano deveria apoiar seu vice-presidente e garantir a revolução bolivariana. Em seguida partiu para Cuba para ser operado.

            O que intriga nessa história da doença de Chavez é que quando ele anunciou o seu agravamento, tinha acabado de retornar de Cuba. Chega de Cuba dia 7 de dezembro, anuncia seu retorno para tratamento no dia seguinte, dia 8, e em seguida retorna à ilha de Fidel. Ganhou as eleições para os governos estaduais de barbada poucos dias depois.

            Algumas circunstâncias chamam a atenção para essa doença de Chavez. Primeiro: ele anunciou seu retorno a Cuba para tratamento pouco antes das eleições; segundo: ele havia acabado de retornar de Cuba. Se era tão grave a doença, por que ele veio constatar a sua gravidade quando estava em solo venezuelano, retornando a Cuba em seguida à sua volta?; Se era grave, por que os médicos cubanos o deixaram retornar de Cuba?; terceiro: a aparência de quem falava de uma doença grave, era a de um homem saudável que poderia perfeitamente esperar para participar das eleições que se realizariam dali a poucos dias, como fez na sua reeleição; quarto: o discurso de Chavez ao anunciar seu retorno a Cuba para tratamento - ao contrário de como reage o comportamento humano – era, não de esperança, mas de quem estaria na iminência de morrer.

            Ora, o que sabemos do estado de saúde de Chavez depois que ele retornou a Cuba tem sido veiculado pelo governo cubano. O interessante é que todas as notícias que vêm sendo dadas a respeito de sua doença são as mais pessimista possíveis, na contramão do que manda o manual do exercício do poder. Nos regimes democráticos já é tradição esconder-se o verdadeiro estado de saúde de seus governantes, sempre se anunciando o seu bem-estar, mesmo quando a situação não é essa. Nos regimes totalitários ou com restrição à liberdade de imprensa ou opinião, essa tradição é muito mais acentuada. Esconde-se a verdade do povo anunciando-lhe sempre a notícia de modo inverso ou diferente da realidade. Nesses regimes, num caso de doença de seus dirigentes, a regra é anunciar que tudo vai bem.

            Por que o governo de Cuba, então, vem anunciando sistematicamente, não só o dia a dia da doença de Chavez, como a sua gravidade? Isso, como foi dito, refoge à regra e esconde, decerto, segundas intenções. Não seria mais lógico dizer que Chavez se recupera bem, está melhorando, etc? Mas não. Faz-se exatamente o contrário. O que causa espécie, de mais a mais, de tudo o que se fala do quadro clínico de Chavez, é que tudo é veiculado pelo porta-voz do governo cubano e a imprensa mundo afora retransmite sem qualquer questionamento como isso fosse verdade. Ou seja, a imprensa livre retransmite notícias passadas de onde não se tem liberdade de imprensa e por quem sistematicamente manipula os fatos. Isso vale para Cuba, como para a Venezuela de Chavez.

            O que há de verdade e mentira nisso tudo? Gabriel Tarde, magistrado francês, 1843/1904, afirmava que “a verdade não é a justeza, é uma quantidade”, ou seja, “é a opinião pública e não uma verdade determinada”. Em outras palavras, ainda que Chavez e o governo de Cuba anunciem ao mundo a gravidade de sua doença, o seu público é o povo venezuelano.

            Pode parecer pretensão, mas vou fazer uma afirmação: o agravamento da doença de Chavez foi providenciado para ele ganhar as eleições. E vou profetizar: ele voltará em pouco tempo para a Venezuela esbanjando saúde, mesmo correndo o risco de queimar a língua e vê-lo retornar de Cuba num caixão.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

A AUTOFAGIA DO PT OU A DOSE DO MENSALÃO NÃO FOI SUFICIENTE





“Há uma enorme diferença entre presumir uma opinião como verdadeira, porque, apesar de todas as oportunidades para contestá-la, ela não foi refutada, e pressupor sua verdade com o propósito de não permitir sua refutação” (John Stuart Mill)

Fico a me perguntar se alguém na imprensa brasileira - que vocaliza a vida política do país - ou alguém de bom senso não enxerga que há uma luta intestina dentro do Partido dos Trabalhadores pelo poder. Já disse antes que a condenação no julgamento do mensalão pelo STF de alguns dos seus principais próceres da seção paulista do PT – com o aval do Planalto – já era um indicativo claro dessa afirmação. As declarações do ministro Fux há poucos dias ao jornal Folha de São Paulo reafirmam essa convicção na medida em que disse que após procurar o manda-chuva José Dirceu para chegar ao STF, ainda assim votou pela sua condenação em seguida à sua nomeação por Dilma Roussef. Rosa Weber, por sua vez, foi indicação de Tarso Genro, desafeto de José Dirceu.

O Palácio do Planalto – entenda-se a seção gaúcha do PT – por certo sinalizou na condenação de José Dirceu e seus companheiros de São Paulo devendo os estilhaços alcançar o ex-presidente Lula. Não fosse assim, Fux e Rosa Weber, esta nomeada pouco antes do julgamento do mensalão por Dilma, não teriam votado pela condenação da turma de São Paulo. Essas condenações, por óbvio – e segundo Nelson Rodrigues as pessoas enxergam tudo, menos o óbvio – tinham por objetivo minar a candidatura paulistana de Hadad e atingir o ex-presidente Lula, pretenso ou virtual candidato à sucessão de sua criatura, Dilma Roussef, em 2.014. Mas a dose do mensalão não foi suficiente.

Não foi suficiente, pois ao contrário do que os “experts” (assim mesmo, entre aspas) em política previram, Lula, contra todos os prognósticos, impôs, indicou e elegeu seu poste também em São Paulo, como já fizera com Dilma Roussef. A seção gaúcha do PT avaliou que Lula perdendo em São Paulo, estaria desgastado para a eleição em 2.014. Mas como a dose do mensalão na eleição paulistana não foi suficiente, o Planalto pôs em curso a operação Porto Seguro. Nessa operação, que teve como epicentro a chefe de gabinete da presidência da república em São Paulo, o vice-rei da AGU e dois obscuros irmãos Vieira, o alvo mesmo acabou sendo Lula, padrinho e amante da primeira.

O governo jura que só soube da operação um dia antes da sua deflagração, pois, segundo o ministro da Justiça, a polícia federal é uma polícia republicana (palavra tão ao gosto no jargão petista) e não de partido, só agindo dentro da legalidade com extrema independência. Só um tolo poderia acreditar nessa versão, pois qual seria o delegado que teria peito para levar adiante uma investigação que iria acertar em cheio a reputação do maior nome do PT, Lula, à revelia do superintendente da PF em São Paulo, do ministro da justiça e da presidente da república? A revista Veja chega a ser pueril – ou se faz, pois de há muito vem fazendo o jogo do governo Dilma - quando diz que a operação Porto Seguro só foi possível devido a uma medida administrativa tomada por Tarso Genro ao tempo em que foi ministro da Justiça, permitindo a descentralização das ações da PF. O sogro do atual ministro da Justiça não seria tão presciente assim.

O jornal O Estado de São Paulo de 3 de agosto divulgou uma pesquisa feita pela CNT, realizada nos dias 18 e 22 de julho deste ano, dando conta que Lula teria 69,8% das intenções de votos para presidente num cenário contra um candidato da oposição se a eleição fosse realizada naquela data, e Dilma, 59%, contra esse mesmo candidato. A mulher que tem a caneta e o diário oficial nas mãos tem menos votos que o populista sem mandato. Ou seja, antes da eleição de Hadad que se daria menos de três meses depois, Lula já mostrava sua força e isso o Planalto sabia. Assim sendo, deixaria ou permitiria a deflagração de uma operação policial que iria atingir em cheio a sua reputação se não tivesse justamente esse interesse?

Por que – essa pergunta tem de ser repetida - na medida em que o PT de São Paulo mostra força através de seu líder maior, o ex-presidente Lula, elegendo Hadad, o Planalto iria permitir que se levasse a cabo uma operação policial que teve na proa o seu nome? A resposta é: porque Lula é o principal concorrente em 2.014 da presidente Dilma. Ou alguém em sã consciência acredita que a polícia federal não fez escutas com a d. Rosemary? Só que o Planalto, através de seu ministro da justiça, acha que divulgar conversas dessa senhora não seria recomendável ou porque a dose seria cavalar para mostrar o que os cegos já veem.

Mas não acabou por aí. Agora vem à tona a figura de Marcos Valério fazendo acusações veladas ao ex-presidente Lula, dizendo que ele não só sabia, como deu ordens para se levar adiante, vamos chamar assim, a operação mensalão, bem como afirmando que pagou despesas pessoais de Lula depositando 100 mil reais na conta de Godoy, um lacaio do ex-presidente. Temos na sequência as condenações do mensalão, a operação Porto Seguro e as recentes declarações de Marcos Valério num espaço de menos de quatro meses envolvendo Lula em escândalos. Será coincidência?

Por fim, como em toda farsa que se preze, Dilma e seus acólitos fazem o mise en scène como manda o figurino. Primeiro, mandando José Eduardo Cardozo ao Congresso explicar para sua claque pelego-governista a isenção do governo na operação Porto Seguro pela polícia federal; depois, Dilma com sua indisfarçável satisfação - ou insatisfação? – defendendo Lula das acusações de Marcos Valério. Não sabemos se ainda restarão dias este ano para uma nova investida ou um novo escândalo contra o ex-presidente, mas 2.013 terá 365 dias.

O restante da defenestração de Lula e do jogo do governo são feitos pela oposição que com esse simulacro de crise no PT dá tiro no alvo errado e, pela imprensa, que não enxerga, ou se enxerga, quer dar uma versão dos fatos distantes de sua realidade, publicando de modo seletivo aquilo que lhe é passado pela PF. O PT está em processo de autofagia política, se comendo, como já ocorreu na Rússia soviética. Só não sabemos se haverá alguém fugindo para o México.