domingo, 16 de junho de 2013

COTIDIANO DA POLÍTICA BRASILEIRA

            

“O falso líder brasileiro, o falso líder é fácil de fazer-se. Ele se for das omissões se alista na famosa reserva moral que nunca se arrisca. Ele cumpre seu dever na voz passiva. Ele não erra simplesmente porque não age. Não se gasta somente porque não se engaja. Ele está sempre disponível para confirmar o que os outros já fizeram. É o estadista do óbvio, o que serve a todos os regimes com igual subserviência e invariável disponibilidade moral” (Carlos Lacerda)



Chico Anysio criou um personagem nos seus áureos tempos de comediante - Bento Carneiro, Vampiro Brasileiro – que não ficou famoso como outros de seus personagens, mas que era tão bom quanto aqueles por ele criados, embora parte das pessoas não alcançasse onde ele queria chegar. Bento Carneiro era aquele vampiro ridículo, sem graça, que não assustava e nem metia medo em ninguém, daí porque Chico Anysio com sua genialidade tenha acrescido o “vampiro brasileiro” ao nome de Bento Carneiro para mostrar que vampiro que se preze tem que meter medo e o Brasil não é lugar de vampiro. Na verdade era uma crítica a certos comportamentos e costumes da sociedade brasileira e suas instituições que muitas vezes estavam na contramão da razão e do bom senso.

            Se Chico Anysio estivesse vivo, Bento Carneiro poderia encarnar a atual classe política brasileira, que embora possa meter medo no povo brasileiro, prima pelo ridículo e pela falta de ideias e comportamentos sensatos. Aqui neste país como se sabe o conceito de governo e oposição acabou, chegando a se confundir, como os porcos e os donos da fazenda na obra de George Orwell, A revolução dos Bichos, quando não se sabia quem efetivamente era homem ou suíno.

            Nessa disputa pela incompetência não se sabe quem é melhor, ou pior. Veja-se a atitude do hermafrodita político Guilherme Afif Domingos e seu partido PSD. Eleito vice-governador de São Paulo na chapa do PSDB, principal partido de oposição ao governo petista, Afif aceitou um cargo de ministro no governo Dilma. Questionado sobre se sua aceitação ao cargo num governo em que, em tese, ele faz oposição, não seria insólito ou contraditório, Afif e o PSD disseram não haver nenhum problema de compatibilidade ideológico-programático-partidário na sua atitude. Se aqueles que fizeram essa pergunta a Afif houvessem se lembrado da entrevista do dono do PSD, Kassab, quando da criação do partido, teriam se recordado de suas palavras, de que os pessedistas não são de direita, de esquerda ou de centro, muito pelo contrário... E não teriam indagado Afif.

            Por outro lado, o governo de São Paulo acaba de anunciar por seu governador Alckmin (o mesmo que há alguns meses, diante da escalada da criminalidade em São Paulo vitimando policiais, disse que “o Estado não vai se intimidar”), um dos ícones da mediocridade tucana, que os policiais paulistas vão receber um bônus em seus salários quando comprovarem que contribuíram para a redução da criminalidade em suas áreas de atuação. A receita que se parece mais com o sistema de recompensas do velho oeste americano, além de mostrar o despreparo da gerência governamental brasileira, indica o que deve acontecer com esse incentivo pecuniário aos policiais.

            No começo do século passado, a peste bubônica tomou conta do Rio de Janeiro. Osvaldo Cruz ao associá-la aos ratos estimulou uma campanha com a população do Rio para interromper a disseminação ou a diminuição desses roedores. Para cada rato capturado o governo pagaria certa importância em dinheiro. Com isso, agindo o povo na captura de ratos e ainda ganhando um dinheiro por isso o problema da peste bubônica estaria resolvido, certo? Errado. Descobriu-se que o povo estava criando rato em casa para vender para o governo, tornando-se uma fonte de renda. Adivinhem como os índices de criminalidade em São Paulo vão diminuir dando aos seus policiais um bônus em dinheiro por cada criminoso preso ou indiciado.

            Essa é a nossa oposição política, cheia de criatividade e gestão políticas.

            O governo por sua vez – se considerarmos governo, o federal – também não perde a pose em suas doses de mediocridade. A diplomacia do governo Dilma não tem competência e eficiência para libertar 12 torcedores presos num país de fundo de quintal, que é a Bolívia, agredindo os mais elementares princípios de direito penal e internacional. A segunda mulher mais poderosa do mundo, no entanto, não tem força e autoridade para enquadrar o índio Morales e exigir a soltura desses pobres brasileiros. Ah, se fosse com os norte-americanos fatos semelhantes como esse não ocorreriam (por muito menos os norte-americanos já teriam botado muito mexicano para correr). Mas se se falar algo assim, estar-se-á agindo como recruta dos EUA, em tempos de patrulhamento ideológico, pois devemos respeitar a soberania de nossos hermanos. Nessas horas não me sai da cabeça aquela máxima de Nelson Rodrigues de que o brasileiro tem complexo de vira-lata.

            Agora há pouco o governo, a sétima economia do planeta, anuncia que vai contratar 6.000 médicos cubanos para suprir as nossas carências médicas na periferia das grandes cidades e no interior do Brasil. Sem entrar na discussão se tais médicos estão ou não qualificados para exercer a medicina (eu duvido muito que um país como Cuba, isolado economicamente, possa preparar médicos de excelência), tal medida, na verdade, expõe a deficiência médica para quem arrota estar acabando com a pobreza. O Brasil potência, expressão que o petismo roubou dos militares com o seu recorrente sofisma e manipulação gramaticais, não tem competência para formar médicos no Brasil e prefere esconder o escandaloso quadro da saúde brasileira com medidas populistas que só mascaram a nossa pobre realidade, de hospitais caindo aos pedaços, déficit de médicos, pacientes morrendo na fila de hospitais, etc, etc, etc.

            Por último, o difundiu-se há pouco um boato de que o governo ia acabar com o “bolsa família” e ainda haveria um presente de dia das mães de R$ 200,00 da mamãe Dilma para as mães brasileiras. Resultado: correria às agências da Caixa em 12 estados brasileiros para sacar o dinheiro. O governo Dilma antes de qualquer questionamento já foi acusando a oposição (ou aquilo que chama de oposição) de ser a responsável pelo tal boato. Quem, no entanto, teria interesse numa notícia dessa e quem, senão o próprio governo, teria condições de mobilizar e potencializar um boato dessa embocadura, com os meios e recursos que ele dispõe? Na sequencia veio o discurso oficial de que a Polícia Federal já está investigando o caso. E sabe qual vai ser o resultado dessa investigação? Aquela mesma de quem procura o pote de ouro debaixo do arco-íris.

            Está faltando neste país governo e oposição. Uma mão que governe (não a mão do chicote) e uma voz que conteste (não a voz do embuste), elementos mínimos de uma democracia. Essa degenerescência moral se espalha no tecido social brasileiro inoculando seu vírus e matando pouco a pouco seu moribundo paciente, o povo brasileiro. Sim, talvez a profecia de Austregésilo de Athayde tenha se confirmado quando, há mais de meio século previu: “Por mais importante que seja abrir escolas primárias, não posso deixar que mais grave que não saber ler é, apenas sabendo ler, com esse escasso conhecimento conquistar diplomas profissionais e ascender aos postos superiores do Estado. Temo o triunfo dos analfabetos, que cada vez mais se acentua ameaçando o futuro do Brasil”.

            Parece que esse futuro chegou ao Brasil.


Obs.: quando este artigo foi escrito os torcedores corintianos na Bolívia não haviam sido soltos. Há uma semana sete deles foram postos em liberdade, mantendo-se a situação prisional nas mesmas condições em relação aos demais; do mesmo modo, Guilherme Afif Domingos sofre ameaça de impeachment na Assembleia Legislativa de São Paulo, mas já se sabe que lá ele tem maioria para manter seu cargo de vice-governador, em que pese ter sido exonerado temporariamente de seu cargo de ministro para assumir a governança de São Paulo na viagem de Alckimin ao exterior. E já voltou a ser ministro com a volta do governador!

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