domingo, 20 de outubro de 2013

AONDE FOI PARAR O BRASIL?

                


“Só os homens de bem podem amar vigorosamente a liberdade; os demais amam não a liberdade, mas a licença, que sob os tiranos gozam de irrestrito alcance e inteira indulgência. Dos maus, os tiranos raras vezes esperam agressão ou mesmo suspeitam, sendo todos naturalmente servis” (John Milton).


Há quatro meses quando o Brasil foi tomado por movimentos populares exigindo mudanças no tecido institucional do país, não faltaram vozes “autorizadas” e “especializadas” para dizer que estávamos iniciando uma nova era, que estávamos vivendo uma revolução. O coro dos insatisfeitos e indignados denunciava as mazelas do país sedimentadas pela corrupção que carcomia o dia-a-dia dos brasileiros. E a lista das reivindicações populares tinha um espectro enorme – ia da insatisfação do aumento das passagens de ônibus (os tais 20 centavos) ao desperdício do dinheiro público, gasto, sobretudo, com a construção dos estádios de futebol para a copa do mundo. Sentindo, num primeiro momento, o baque das reivindicações o país (entenda, o Governo) “reagiu” suspendendo o aumento das passagens de ônibus e, na sequência, importando médicos cubanos para suprir a falência do serviço médico-hospitalar. Não faltou também pela voz autorizada dos “especialistas” o diagnóstico de que o Brasil estava vivendo uma revolução, e, todos aqueles que eram alvos das reivindicações populares, afirmando a justeza dessas postulações.

            Foi, em outras palavras, como se o dono de um imóvel alugado aceitasse de modo cordato as reclamações de seu inquilino pelo preço abusivo do aluguel que lhe é cobrado; ou como se o dono de uma banca de verduras aceitasse passivamente a acusação de seu cliente de que ele lhe estava roubando no preço. A resposta recorrente foi “o povo tem razão”. Ora, passados quatro meses o que ficou evidente é que além de demonstrar que o povo brasileiro é como relógio de corda, nada, absolutamente nada resultou da “voz das ruas”. Em 1.789, por ocasião da tomada da Bastilha pelo povo francês, um certo duque de Liancourt correu até Luiz XVI para avisá-lo da inssureição popular que estava ocorrendo e o rei lhe perguntou se se tratava de uma revolta, pelo que lhe foi respondido: Sire, não é uma revolta, é uma revolução”. O resto da história todos devem saber, mas quem quiser saber mais detalhes desse episódio deve ler A história da revolução francesa, do inglês Thomas Carlyle, e constatar que o caso brasileiro terá sido mera e farsesca coincidência.

            No Brasil, ao contrário do que anunciaram os nossos corifeus da ciência política – de modo ingênuo ou atendendo a interesses inconfessáveis do Governo – tudo não passou de uma revolta. E pior, uma revolta de caráter pontual, pois nada, absolutamente nada, aconteceu de bom no Brasil desde então. Mas, sem o esmalte do cinismo e o confete da hipocrisia, pode-se afirmar que não só nada mudou, como ficou pior. O caráter autoritário do Governo – entendido em todas as suas esferas legais – se acentuou e a prestação dos serviços públicos – uma das bandeiras da revolta – se não piorou, estacionou numa pasmaceira do Governo com seus arremedos de enganação. O programa “Mais Médicos” que o diga. Cheguei até mesmo a escrever um artigo nesse sentido para o meu blog, mas como não o publiquei, não me vale a invocação de pitonisa.

            Dois exemplos – de tantos outros - de autoritarismo estatal evidenciam como o Brasil não avançou absolutamente nada após as reivindicações populares (vamos chamar assim, ao invés de revolta ou revolução). A lei do “lixo zero”, posta em prática pelo governo municipal do Rio de Janeiro e o ressuscitamento da lei de segurança nacional, aplicada por alguns governos estaduais para enquadrar aqueles remanescentes que saem às ruas e que promovem atos de desordem pública, são prova disso. No primeiro caso, quem jogar o que quer que seja nas ruas do Rio de Janeiro, leva uma multa. Insurgindo-se contra a punição administrativa ou se recusando a dar sua identificação a pessoa é levada coerciva e compulsoriamente para uma delegacia de polícia. O que escandaliza não é o fato de a prefeitura do Rio criar uma lei punindo aqueles que sujam a cidade; o que escandaliza é alguém ser conduzido a uma delegacia de polícia sem ter cometido qualquer crime tal como deve ser entendido esse conceito, mesmo porque a tipificação de condutas tidas por crime só pode ser criada por lei federal. Há pouco mais de uma semana uma faxineira foi conduzida à delegacia de polícia por fiscais do “lixo zero” por ter cometido o “crime” de jogar um papel de bala na rua.

            O outro exemplo da veia autoritária do Governo é “reanimar” a lei de segurança nacional, pois ressuscitá-la, segundo disse um “especialista” em direito penal, é incorreto, já que ela nunca esteve morta ou deixou de existir. Sim, ela não esteve morta, mas pertence a um tempo em que o seu corpo não convive – ou deveria conviver – com o espírito do nosso tempo. Sob o pretexto de que as depredações de um bando de baderneiros (e sabe-se lá, a soldo de quem eles estão, quem advinha?), o Governo usa da sua força não para dispersar esses arruaceiros, mas para inibir quem quer que ponha a cabeça na rua para gritar contra os abusos do Estado. Essa receita é antiga e Montesquieu já a denunciava quando dizia que a pior das ditaduras é aquela que vem amparada pela bandeira da democracia e o suporte das leis formais.

            Na contramão dessas evidências – ou não seria de mãos dadas? – o país recrudesce econômica e culturalmente. Primeiro com o anúncio de que a Petrobrás caiu no ranking das grandes empresas do mundo em eficiência e lucratividade. Logo ela, um monopólio estatal que não tem concorrentes e que impõe os seus preços como bem quer ao povo brasileiro. Como é possível não se ter concorrentes, vender uma das gasolinas mais caras do mundo ao seu povo e, ainda, ser deficitária? Na pergunta, por óbvio, encontra-se a resposta a essa indagação.

Por outro lado, a Universidade de São Paulo, até então uma de nossas ilhas de excelência na educação perdeu sua posição entre as 200 universidades do planeta. E a explicação para essa queda, segundo o luminar da educação brasileira, o ministro da Educação, Aluísio Mercadante, se deu porque a USP excluiu da sua grade curricular o ensino do inglês. Isso seria cômico se não fosse trágico – ou se não fosse uma dessas muitas mentiras governamentais escamoteadas pelo duplipensar que George Orwell denunciou no discurso dos regimes totalitários. Ainda que essa afirmação não seja verdade, no entanto, ela revela e deixa a todos perplexos, saber como é possível retirar da grade curricular de uma prestigiosa universidade, como a USP, o ensino do inglês. Tal justificativa só pode ser por questões ideológico-partidárias, pois num mundo globalizado em que as transações comerciais mundiais se dão na língua inglesa e as grandes publicações acadêmicas e científicas são publicadas na língua de Shakespeare, é um retrocesso – para não dizer burrice, estupidez – a supressão do ensino do inglês.


A “presidenta” Dilma, como ela gosta que lhe chamem os seus lacaios e bajuladores, disse por ocasião da eleição do papa Francisco que sua santidade era argentino, mas que Deus era brasileiro. Não, “presidenta”, Deus eu não sei se é brasileiro, mas o Diabo, eu tenho certeza, como disse certa vez o escritor Antonio Callado. Aonde foi parar o Brasil? A lugar nenhum!