O “GOLPE” CONTRA FERNANDO LUGO
“A indignação moral é uma das forças mais
nocivas do mundo moderno, ainda mais porque pode ser sempre ser desviada para
usos sinistros por aqueles que controlam a propaganda” (Bertrand Russel)
O Governo do PT anda alardeando e
comandando um coro para fazer crer que o congresso paraguaio deu um golpe para
destituir dom Fernando Lugo do poder. Teve adesão de Bolívia, Equador,
Argentina e Venezuela que não reconhecem, por enquanto, o novo governo
paraguaio. No dia do impeachment –
não sei por que – o governo brasileiro mandou seu ministro das relações
exteriores para acompanhar o processo de impedimento do presidente paraguaio
para verificar a legalidade das ações dos parlamentares paraguaios. Patriota voltou
de lá calado. Antes não tivesse mandado ninguém para lá, porque assim teria pelo
menos um motivo mais plausível para dizer que houve um golpe branco no país
vizinho, que não aquele que tem sido verbalizado pela mídia de que o processo
foi muito rápido e sumário.
Mas, afinal, houve um golpe de
Estado no Paraguai? Se houve, o golpe foi bem dado e com os retoques dos tempos
modernos. Sem tanques, fuzis e baionetas; o presidente deposto não teve que fugir
e nem foi preso, tradição que sempre se viu em golpes na América do Sul. E Lugo
ainda dá entrevista, inclusive numa televisão estatal do Paraguai, dizendo que
foi deposto por forças conservadoras do país. Se isso fosse pouco, as televisões
do mundo todo (do mundo todo é exagero, pois esse fato não merece a atenção de
todo o planeta) transmitiram ao vivo, voto a voto, o processo se afastamento do
señor Lugo. Isso me parece mais
ingredientes de uma democracia do que de ações de um putsch.
Quando isso seria possível em outros tempos? Os
governos que não reconhecem o novo governo de Frederico Franco o fazem mais por
razões ideológicas do que por razões de preservação da ordem democrática e
muito menos por razões de Estado. Assim, que moral tem um Evo Morales, por
exemplo, que invade refinarias da Petrobrás na Bolívia, para dizer que o
Paraguai deu um golpe de Estado? Que moral tem a Argentina que nacionaliza uma
empresa de petróleo espanhola a preço vil e censura a sua imprensa
oposicionista, para falar de golpe? Que moral tem a Venezuela para acusar os
parlamentares paraguaios de golpe, se o seu líder Chavez quer se perpetuar no poder com
populismo e casuísmos legais na Constituição venezuelana e sucessivas
reeleições? Que moral tem o Equador, do mesmo modo, quando faz pacto com
terroristas das FARC, abrigando-os em seu território para desestabilizar
governos que não se afinam com a esquerda que quer se impor compulsoriamente na
América do Sul? Todo esse discurso não passa de falsa indignação moral que
esses países procuram veicular pelo uso da propaganda oficial que detêm.
Nos dias que antecederam o impeachment e mesmo no dia da cassação
de Lugo, ouvi de analistas alinhados com esse discurso do golpe, que foi ferido
o devido processo legal, pelo rito sumário e rapidez com que foi conduzido o processo
de afastamento do presidente do Paraguai. Mas não ouvi ninguém dizer ou apontar
que na Constituição paraguaia não há previsão legal para que o presidente possa
ser afastado no prazo em que Lugo foi defenestrado. Todo mundo sabe que o
processo de impeachment em qualquer
lugar do mundo é um processo político e não tinha porque os opositores de Lugo
dar tempo aos seus aliados para conspirar pela sua permanência. Nossos hermanos paraguaios foram inteligentes
nesse ponto, pois sabiam que em política o tempo funciona, ou melhor, conspira,
contra as situações de fato e quanto mais rápido se agir, melhor, fazendo valer
aquela máxima de Magalhães Pinto que dizia que em política as coisas mudam de
uma hora para a outra, sendo ela como uma nuvem, que numa hora você vê um
cachorro que em seguida se transforma em um cavalo, num elefante, numa vaca...
A história nos dá exemplo disso. Na França
revolucionária de 1.789, no auge dos embates entre girondinos e jacobinos para
definir quais os rumos que o país tomaria, se o terror ou a volta da
normalidade, um deputado girondino Jean Baptiste Louvet acusou Robespierre
abertamente de seus crimes na Convenção. Apontou ele, segundo nos dá conta
Thomas Carlyle em sua História da Revolução
Francesa, “crime após crime” de Robespierre: “temperamento ditatorial,
popularidade exclusiva, intimidação eleitoral, séquito de populaça, matanças de
setembro, até que toda Convenção se pôs a gritar e quase inculpava o
Incorrutível ali mesmo. Nunca o Incorrutível correu tal risco. Louvet até à sua
morte, lamentou-se sempre que a Gironda não tivesse assumido uma atitude mais ousada
e não o tivesse eliminado ali e então”. O que veio depois dessa inação girondina,
todos devem saber.
Os políticos paraguaios não quiseram
que a história se repetisse como uma farsa e muito menos como tragédia, para
lembrar Marx n’O 18 Brumário de Luiz
Bonaparte, e trataram de desapear Lugo rapidamente do poder. Lembram-se do escândalo
do mensalão em 2.005, quando os bobocas da oposição brasileira não agiram rápido?
Pois é. O governo brasileiro faria
melhor se reconhecesse logo o novo governo paraguaio, pois o não reconhecimento
não altera em nada a situação política por lá. Lugo não volta. Ou por um acaso
se vai tentar fazer no Paraguai o que se tentou em Honduras, quando Lula e
Chavez tentaram reintroduzir o presidente legitimamente afastado daquele país
pelas instituições hondurenhas, numa verdadeira operação bufa? Os paraguaios,
afora a claque levada para a porta do congresso de lá, não estão nem aí para o
presidente deposto e, muito menos, os quase 500 mil brasiguaios que vivem no
Paraguai e não suportavam mais o populismo barato do presidente deposto.
Quem teve 1 voto na Câmara paraguaia
e 3 no Senado, como teve Lugo, não podia mesmo ficar no poder.