“Não é com argumentos racionais que se sublevam as multidões . Por meio de crenças elas sempre serão dominadas” (Gustave Le Bon).
Há tempos queria escrever um artigo sobre Bin Laden. Mas como fui tomado pela notícia de sua morte , resolvi que não deveria mais adiá-lo. Por que queria escrever ? Porque nunca acreditei que Bin Laden existisse ou , se existiu, sua existência foi ou é alimentada pela política antiterror dos Estados Unidos. Mas , podem indagar , quem sou eu para falar de política externa e, sobretudo , da política externa dos Estados Unidos? Não sou nada , nem analista político , internacional , militar , nada . Só que ainda não perdi a capacidade de pensar . E, tendo em mãos um livro defendendo o que afirmo, os que o leram ou lerem poderão me dar razão no que estou afirmando.
1984 de George Orwell é um livro que deve ser lido para que possa ser entendido o que estou dizendo. Na obra há um personagem central , mítico, abstrato , onipresente , sólido e volátil , tudo ao mesmo tempo : o Grande Irmão ou Big Brother para aqueles mais afeitos ao programa televisivo global do mesmo nome . O Grande Irmão está em todos os lugares ao mesmo tempo e o tempo todo . Sua antítese ou seu contraponto é Emanuel Goldstein: um personagem que , como Grande Irmão , é mítico, onipresente , sólido , volátil e abstrato . Ninguém , porém , os vê , só que o primeiro encarna o “bem ” e o segundo “mal ”. Assim mesmo , entre aspas . Do que estamos falando nestas linhas um é Bin Laden, o “mal ”, e o outro os Estados Unidos, o “bem ”.
O livro de Orwell, escrito em 1.948 pouco antes de sua morte , ainda que possa sugerir um anagrama numeral para o título da obra , retratou a era stalinista dos anos 30 e 40 do século passado . Um estado policial que controlava a vida das pessoas ininterruptamente , inclusive a sua privacidade .
A obra de Orwell, mais atual que nunca , retrata ainda como o Estado por ele previsto manobra e manipula a sociedade , impondo um absurdo maniqueísmo. Assim , durante quase dez anos , depois do 11 de setembro de 2.001, Bin Laden foi o inimigo público nº 1 dos Estados Unidos: o governo americano alimentou no consciente coletivo de seu povo o ódio a um personagem que ninguém sabia onde estava, o que fazia, onde morava. Apenas um rótulo : o responsável pelo atentado do 11 de setembro . O bem contra o mal .
Essa receita - identificada na Rússia stalinista por Orwell -, entretanto , vem sendo usada com eficácia de tempos em tempos na história da humanidade , bastando dar como exemplo o que Goebells fez na Alemanha nazista , quando conseguiu através de uma propaganda maciça convencer um povo culto como o alemão de que os judeus eram a essência do mal .
Está? Isso pouco importa. O que importa é que continue haver um constante estado de guerra que se diz haver no já anunciado herdeiro e sucessor de Bin Laden - um tal médico egípcio Aiman não-sei-o-que - que irá continuar a cruzada terrorista contra os povos livres e civilizados do ocidente . Em um trecho de 1984, um integrante do Partido do Grande Irmão diz como devem ser os seus membros (que devem ser traduzidos como o povo ): “um fanático crédulo e ignorante , cujas reações principais sejam medo , ódio , adulação e triunfo orgiástico. Em outras palavras , é necessário que tenha a mentalidade apropriada ao estado de guerra e, como não é possível uma vitória decisiva , pouco importa que a guerra vá bem ou mal . O que importa é que possa existir o estado de guerra ”.
O anúncio da secretária de estado Hillary Clinton de que a morte de Bin Laden não põe fim à guerra ao terrorismo e a catarse (“triunfo orgiástico”) do povo americano que se regozijava em frente à Casa Branca comemorando a morte de seu inimigo público nº 1, não poderiam tornar mais proféticas, verdadeiras e atuais as palavras de George Orwell de que estamos - e sempre estivemos - ainda , vivendo num mundo de engodos e mentiras .
Some-se a isso as circunstâncias obscuras de sua morte , quando não se mostra o seu corpo ou mesmo uma fotografia , um exame de DNA que ninguém sabe quando e como foi feito para comprovar a identidade do Bin Laden, e, aliado ao anúncio de que seu corpo foi jogado ao mar , alimenta-se, propositadamente , a crença nos crédulos que sua alma guiará outros fanáticos da qual a América precisará se proteger . “A mentalidade apropriada ao estado de guerra ”.
Leiam 1984, conheçam o seu Ministério da Verdade e terão certeza que estamos vivendo 1984.